Azul sem nome


longo destino sob a noite nas pedras de ninguém
quando o rio destoa das vertentes do céu
profundo sob o peso rasgado da chuva

mesmo a certeza desaba além dos homens

longa e lenta a história inscrita nessas mãos
mais vivas do que a luz no impulso do fim
mais ocas do que as trevas à procura do azul

Lilia

domingo, 27 de junho de 2010

a tarde

fiquei a tarde à toa no poema a tarde definhando
as cores vivi a tarde esquecendo o tempo
a tarde é pouca e raros os amores
pensei a tarde como um corpo inteiro e estive tardemente
em toda vida cheguei depois do tempo e descobri
que não seria mais no tempo que me coube
não seria e não fui e tão suavemente que nem soube
que a passagem espreita um só momento e quando
cadente estrela desabamos já a cinza é tudo e nada
e somos o vazio o esplêndido vazio que entende a tarde

Lilia

quarta-feira, 16 de junho de 2010

silêncio

era esta solidão que consumia os olhos

sentir sem ver
cega de palavras

e quando
e só

Lilia

rosto

no meio de mim estende-se o horizonte
hesita
e explode em água e cor

duas centelhas tremeluzem ainda

é tarde

... e vivo


Lilia

terça-feira, 15 de junho de 2010

quando a voz é silêncio

o silêncio de mim
na densidade de teu corpo
tem o gosto eterno
das tormentas
- quando a voz é silêncio

silêncio meu de mãos
na correnteza feroz
com que me inventas
e me afogas - indelével -
nos olhos cerrados

(beija o meu beijo
nas faias dos meus versos)

Lilia
(parece ser dos meus poemas antigos...)

ainda e nunca

as duas mãos na chuva palavras ao vento corte do infinito
espanto
as gotas pousam no destino
revoam dores de inquietos chãos

quantas vidas brancas tornaram ao orvalho
quantos dias danças quadros cabaletas vozes caras
esboçaram os dias
as lágrimas nem as névoas rememoram

(revejo seis de sonhos confidências
nós ao todo
no laço azul éramos árias entoadas
dós amargos bravura
intermezzos)

velado nosso rumo no curso das águas
alcançamos o sereno
em tempo surreal
as bocas declinam sóis poentes
os olhos luas decrescentes
cantam
apenas as mãos
as mãos ainda chuva e vento
as mãos palavras

Lilia
11 de abril, 2010

dois Horizontes III


imóvel o ar


não se move o desejo sem o vento
- e eu perdi o vento na passagem
não se vive uma brisa sem desejo
- secou-se o beijo à sombra do meu tempo

que luz ainda força a ideia à fantasia
que ser escolhe ainda o verso imóvel
nos tropeços das lembranças na voragem
que portas de medo que segredo
o homem articula com o futuro
e quantos silêncios nos sons da sinfonia
são presságios de vigília e de relento

apenas o sonho como assim se chama
move a alma apenas esse extremo é poesia
o mais é o imóvel ar a flama ausente
a mente sem destino – amente


Lilia

dois Horizontes II

foi candente a órbita do azul
com sentido e medo
no quanto de momentos fiz para uma vida
e a cor
no alento de vertigem única
deixou duas luas de luz na história do meu corpo

Lilia

dois Horizontes I

ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas

e.e.cummings

e chove
tua cidade esconde a serenidade de saber-te ali
ao alcance do meu grito mais suave
entre caminhos de vozes e ventos cuja cor chora
a desistência dos sonhos
e ama
tua chuva cai em meus cabelos como aquelas flores
pintadas nos jardins de Uffizi - enquanto choves
diz ao meu desejo: qual a estação do teu olhar -
ao meu recordo no ciclo entre mim e as nuvens
e lembra
aqui era o sereno feito corpo mais que sentimento
quando os grilos encantavam as águas em outro ermo
- apenas o teu nome sabe a imensa e minha loucura -
e ousa
se ousares abre mais essa janela que o caibro esconde
e voa sobre as palmas - as mãos de chuva nos meus olhos
e acalenta estas palavras como - sempre e nunca -
e esquece
Lilia