Azul sem nome


longo destino sob a noite nas pedras de ninguém
quando o rio destoa das vertentes do céu
profundo sob o peso rasgado da chuva

mesmo a certeza desaba além dos homens

longa e lenta a história inscrita nessas mãos
mais vivas do que a luz no impulso do fim
mais ocas do que as trevas à procura do azul

Lilia

domingo, 31 de agosto de 2008

desmesura

em uma lua anterior ao mundo
ocultavam-se as angústias

na imperfeição do tempo
luamo-nos – semicírculos infinitos –
na partitura das paixões

ora finda-se o sol transfigurado
e morrem pedras ao nosso silêncio

por que senso de dor cala-se o instante
desmesurado em futuro?

Lilia Silvestre Chaves

dois poemas

saudade


ainda resta um horizonte de agonia
nas memórias mortas
um limite triste do vazio
que abranda o sono do tempo

mas

assim como ao cair da noite
subsiste um gosto de orvalho
nos mármores adormecidos
sob a sombra
o límpido afago materno
sobrevive no anseio dos dias
do meu corpo aconchegado
nos seus olhos


Lilia
fábula

ah tempo tu que és tão forte...

desfaz o esquecimento que prende o coração
ao momento da agonia
acelera os dias do pranto oh tempo
rebojo de sonhos
tu que não me poupas e me revês
em redemunho
corta-me em duas me esfaz na espera
sem prumo inevitável
no acre andamento
do meu tom

tempo que me desarruma
e maltrata e acalma e aconselha
esfuma o nome testemunho de mim mesma

... derrete a neve que prende o meu pezinho...
Lilia

cedimento

a madrugada inunda a página –
cedo verdades sem palavras
ardem
ao sabor da hora
imensa

o tempo imperioso do momento
ressoa ao gesto incerto

é tua – guerreiro do azul perdido –
é tua a lembrança da noite?

LSC

manhã



sem a história da ausência
somente
sombras e sons desconhecidos
sem a história de meu nome
apenas sementes
no declive da vida

nem flores nem feras
sem a saudade táctil
da página luminosa
nem cúmplices os olhos
nem laços os versos

e a manhã única da escrita
sem a falsa espuma da memória
criaria um sempre dissonante
na vaga totalidade do tempo?


LSC

Cais do porto


longa miséria sob a noite nas pedras de ninguém
quando o rio destoa das vertentes do céu
profundo sob o peso rasgado da chuva

mesmo a certeza desaba além dos homens

longa e lenta a miséria inscrita nessas mãos
mais vivas do que a luz no impulso do fim
mais ocas do que as trevas à procura do azul

LSC